Televisão e Política no Brasil: A Rede Globo e as Interpretações da Audiência

Autor/Organizador: Mauro P. Porto
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Premiada pela INTERCOM como a Melhor Tese de Doutorado de 2001, o livro inclui um marco teórico abrangente e sofisticado sobre comunicação política, cidadania e a recepção dos conteúdos da mídia, além de um estudo detalhado sobre a recepção e os efeitos d

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Quando os brasileiros ligam os aparelhos de televisão durante o horário nobre para saber quais são as últimas notícias ou simplesmente para relaxar, a grande maioria deles assiste a Rede Globo. A programação da emissora neste horário é dominada por dois gêneros, telenovela e telejornal. O noticiário Jornal Nacional e as novelas que o antecedem e o sucedem são os programas de maior audiência da televisão brasileira. Estes programas são importantes “janelas” para o mundo da política, uma das fontes mais acessíveis de informação e interpretação à disposição dos brasileiros.
Qual é a relação entre os principais programas da Rede Globo e o processo por meio do qual os cidadãos brasileiros fazem sentido de temas e eventos políticos? Este livro tem por objetivo apresentar algumas respostas a esta difícil questão. Existem poucos estudos no Brasil sobre a recepção e os efeitos dos conteúdos políticos da televisão. No caso do Jornal Nacional, vários autores já demonstraram o seu papel político ativo e sua tendência de alinhamento com grupos de poder, em especial com o governo federal (Ramos, 1985; Lima, 1988, 2001; Straubhaar, 1989; Guimarães e Amaral, 1990; Albuquerque, 1994; Miguel, 1999; Porto, 2002, 2003). Todavia, ainda existem poucas pesquisas sobre os eventuais efeitos destes conteúdos no modo como a audiência do telejornal interpreta o mundo da política. Uma das raras exceções é o estudo pioneiro realizado por Lins da Silva (1986) em duas comunidades de trabalhadores. Os resultados desta pesquisa sugerem que a influência do Jornal Nacional no modo como os cidadãos comuns entendem a realidade não é tão grande como geralmente se supõe. Os trabalhadores que participaram do estudo apresentaram uma capacidade crítica de “resistir” a forma como o telejornal da Rede Globo cobria os problemas nacionais. Por outro lado, Alessandra Aldé (2004) argumentou mais recentemente que, ao elaborar reflexões sobre o campo político, os membros da audiência incorporam vários dos “enquadramentos” apresentados pelos noticiários, incluindo o Jornal Nacional.
O estudo sobre a relação entre o Jornal Nacional e o processo pelo qual a sua audiência desenvolve entendimentos sobre a política permanece, portanto, como um campo aberto de pesquisa. A pesquisa empírica apresentada na segunda parte deste livro sugere que o Jornal Nacional tem um papel importante neste processo. Os resultados dos dois experimentos controlados conduzidos com moradores do Distrito Federal, relatados a seguir, demonstram que o telejornal mais assistido do País contribui para dar forma às interpretações que os membros da audiência elaboram sobre temas e eventos políticos.
No caso das novelas brasileiras, pesquisadores têm demonstrado o seu papel ativo na discussão de temas e eventos políticos em diferentes períodos da história nacional (Straubhaar, 1988; Rubim, 1989; Weber, 1990; Lima, 1993; Porto, 1998, 2000; Hamburger, 1999). Todavia, ainda não sabemos se este conteúdo político da ficção televisiva tem alguma relação significativa com o processo pelo qual os membros da audiência desenvolvem entendimentos sobre o mundo da política. Um estudo etnográfico em uma pequena cidade no estado da Paraíba argumentou que os espectadores pensam de forma crítica sobre as novelas, “resistindo” o seu conteúdo político (Sluyter-Beltrão, 1993). Um outro estudo etnográfico mais recente, também realizado em uma cidade nordestina de pequeno porte, desta vez no Rio Grande do Norte, apresentou evidências de que grande parte da audiência da novela O Rei do Gado, especialmente as mulheres, não percebeu as referências do texto ficcional aos políticos “reais” ou considerou monótonas e desinteressantes as discussões de temas políticos (La Pastina, 1999, p. 219-222). Por outro lado, alguns sugerem, a partir de entrevistas realizadas com telespectadores, que as representações apresentadas sobre a política pelas novelas são freqüentemente incorporadas às narrativas que as pessoas elaboram sobre o mundo da política, dependendo do tema (Guazina, 1997).
Assim como no caso do Jornal Nacional, necessitamos mais pesquisas sobre a possível influência da ficção televisiva na formação de atitudes políticas. Neste livro, apresento os resultados de seis grupos focais conduzidos com moradores do Distrito Federal sobre a novela Terra Nostra. Os resultados deste estudo sugerem que as novelas desempenham um importante papel de “orientação” para a sua audiência, especialmente para as mulheres. Segundo esta perspectiva, as novelas oferecem marcos interpretativos específicos que são freqüentemente incorporados nas explicações desenvolvidas pela audiência sobre temas e eventos políticos.
Além de apresentar os resultados de um estudo empírico sobre o papel político da televisão, este livro também tem por objetivo desenvolver um marco teórico para a análise da relação entre televisão e o processo pelo qual suas audiências fazem sentido no mundo da política. Este não é, certamente, um tema recente. A relação entre mídia, opinião pública e democracia tem sido objeto de pesquisa e de debate há muitas décadas. Um grande número de pesquisas empíricas foram desenvolvidas a partir de uma variedade de perspectivas teóricas. Diante deste quadro, como um novo estudo pode contribuir para aprimorar nossos conhecimentos neste campo? Necessitamos de novas abordagens teóricas e metodológicas para uma melhor compreensão da influência da televisão nos valores e preferências políticas da audiência?
O marco teórico e a pesquisa empírica apresentados a seguir foram desenvolvidos a partir do pressuposto de que a investigação da recepção e dos efeitos da mídia ainda inclui questões importantes que não foram respondidas de forma adequada. Esta convicção não significa que os estudos desenvolvidos até aqui não oferecem marcos teóricos ricos e sofisticados ou que não apresentam resultados válidos e interessantes. Todavia, a pesquisa empírica sobre a recepção e os efeitos da mídia permanece como uma das áreas mais problemáticas das ciências sociais contemporâneas. O processo por meio do qual a mídia afeta suas audiências é – por causa da sua natureza complexa e dinâmica – difícil de ser identificado e avaliado. Já na década de 1950, ­Wright Mills (1956, p. 311) argumentava que pouco se sabia sobre as funções da mídia porque estas funções eram tão disseminadas e sutis que não podiam ser identificadas pelos métodos de pesquisa então existentes. Quatro décadas depois, o descontentamento em relação à situação do campo permanecia presente. Larry Bartels (1993, p. 267) argumentou, por exemplo, que a pesquisa sobre os efeitos da mídia é um dos maiores embaraços das ciências sociais, já que esforços para comprovar estes efeitos por parte de cientistas políticos enfrentam uma grande variedade de dificuldades metodológicas. Ao fazer um balanço dos estudos de comunicação no mesmo período, Levy e Gurevitch (1994, p. 8) argumentaram que a questão dos efeitos da mídia inclui os problemas menos esclarecidos desta disciplina.
O estudo dos efeitos da televisão na política é importante não só devido às dificuldades teóricas e metodológicas das disciplinas acadêmicas, mas principalmente por guardar uma clara relação com as perspectivas das democracias contemporâneas. Ao buscar marcos de referência na literatura acadêmica para enfrentar e resolver os grandes dilemas da relação entre mídia e democracia, leitores podem se surpreender com a freqüente ausência de uma reflexão sistemática sobre os limites e dilemas da democracia nos estudos sobre a recepção e os efeitos da mídia. Por outro lado, existe uma injustificada falta de preocupação com o papel da mídia por parte dos teóricos da política e da democracia (ver Miguel, 2000). Não desejo com isto sugerir que os pesquisadores da mídia não fazem referência à questão democrática ou que os teóricos da política nunca consideram a mídia. Todavia, são raras as tentativas de debate e intercâmbio entre os dois campos de pesquisa. Este debate poderia contribuir na consolidação das duas áreas e nos ajudar a entender melhor tanto os efeitos da mídia, como os dilemas da democracia no mundo contemporâneo. Os argumentos aqui apresentados buscam contribuir neste processo ao vincular o estudo da recepção e efeitos da mídia a algumas das questões mais centrais da teoria democrática.

ESTRUTURA DO LIVRO
A primeira parte deste livro é dedicada a discussões teóricas e ao desenvolvimento de um modelo para o estudo do papel da televisão na política. O Capítulo 1 discute questões relacionadas ao problema da “competência cidadã”, ou seja, os fatores que capacitam os indivíduos para atuarem plenamente e de forma eficaz como cidadãos. Em especial, o capítulo discute um dos principais dilemas da teoria democrática. De um lado, as teorias clássicas da democracia esperam que os cidadãos sejam bem informados e capazes de deliberar de forma racional. Por outro lado, pesquisas de opinião pública realizadas em diversos países revelam uma realidade incômoda: a maioria dos cidadãos possui poucas informações sobre o mundo da política. Depois de revisar e avaliar as principais respostas apresentadas a este dilema, o capítulo propõe um novo modelo de cidadania (o cidadão interpretante) como uma solução mais apropriada para os dilemas da teoria democrática.
O Capítulo 2 apresenta uma revisão dos estudos e das teorias no campo da psicologia política. Esta revisão é importante porque os debates sobre a relação entre mídia, política e democracia dependem de pressupostos implícitos ou explícitos sobre o processo pelo qual as pessoas fazem sentido do mundo da política. Em outras palavras, noções sobre a natureza humana (racionalidade, ignorância, autonomia etc.) influenciam teorias e agendas de pesquisa. Através da revisão dos principais marcos teóricos no campo da psicologia política, explicitarei os meus pressupostos sobre o processo por meio dos quais as pessoas formam suas preferências. Estes pressupostos são desenvolvidos a partir de conceitos como senso comum, narrativas e interpretação. Esta definição mais explícita e sistemática sobre processos cognitivos pode ser bastante útil na pesquisa sobre a recepção e os efeitos da mídia, já que a maioria dos marcos teóricos existentes neste campo tende a ignorar processos psicológicos.
O Capítulo 3 apresenta uma revisão das principais tradições no estudo da recepção e dos efeitos da mídia. São analisados os dois paradigmas principais neste campo que são geralmente apresentados como perspectivas opostas e irreconciliáveis: o estudo dos efeitos e a pesquisa de recepção. A primeira tradição, o estudo dos efeitos, surgiu a partir das ciências sociais empíricas e geralmente utiliza métodos quantitativos (principalmente experimentos controlados e surveys) para investigar como a mídia afeta atitudes e crenças. A segunda tradição, a pesquisa de recepção, surgiu a partir dos estudos culturais e da teoria crítica e tem utilizado métodos qualitativos para analisar o processo mediante o qual audiências socialmente localizadas constroem e negociam de forma ativa suas interpretações sobre o conteúdo da mídia. Após discutir os principais estudos desenvolvidos neste campo, o capítulo propõe um enfoque integrado que combina elementos das duas tradições de pesquisa.
A primeira parte do livro é concluída com o Capítulo 4 que apresenta o marco teórico da pesquisa e suas hipóteses. Este modelo teórico define a televisão, para fins analíticos, como uma arena na qual diversos grupos e instituições disputam a interpretação dos eventos e temas políticos. A partir do conceito de enquadramento, proponho investigar o papel da televisão no desenvolvimento e resolução de controvérsias interpretativas, disputas que não são resolvidas através do apelo a fatos ou informações, mas que são conduzidas principalmente através de “enquadramentos interpretativos”. O modelo das controvérsias interpretativas, apresentado neste capítulo, sugere que quando a televisão apresenta um único enquadramento ou ponto de vista sobre um determinado tema ou evento político, adotando assim um formato “restrito”, um número maior de pessoas faz sentido do evento ou tema de acordo com este enquadramento. Por outro lado, quando expostos as mensagens com formatos mais “plurais”, que apresentam mais de um enquadramento, os cidadãos têm acesso a um conjunto mais amplo de atalhos e recursos, desenvolvendo interpretações mais variadas sobre a realidade política.
A segunda parte do livro apresenta os resultados de uma pesquisa empírica sobre o papel político da televisão no Brasil. Este estudo foi desenhado para testar a hipótese principal do modelo das controvérsias interpretativas e inclui tanto uma análise de conteúdo de programas de televisão, quanto um estudo de recepção deste conteúdo com moradores do Distrito Federal. O Capítulo 5 apresenta os procedimentos metodológicos adotados e introduz os dois programas analisados, o Jornal Nacional e a novela Terra Nostra, ambos da Rede Globo. O Capítulo 6 apresenta os resultados de uma análise de conteúdo do Jornal Nacional. A pesquisa demonstra que quando o principal telejornal do País apresenta uma cobertura noticiosa restrita, privilegiando um único enquadramento interpretativo sobre um tema ou evento, as fontes oficiais do governo federal recebem posição de destaque no telejornal.
Os Capítulos 7 e 8 apresentam os resultados de dois estudos de recepção sobre os efeitos das notícias do Jornal Nacional no processo de deliberação política de sua audiência. Foram realizados dois experimentos controlados com moradores do Distrito Federal e os resultados destes estudos comprovam a hipótese principal do modelo das controvérsias interpretativas. Ou seja, quando exposta a reportagens com um único enquadramento interpretativo, mais pessoas fazem sentido de um tema (a eficiência do Congresso) e de um evento (uma decisão do Supremo Tribunal Federal) de acordo com a interpretação promovida por este enquadramento.
O Capítulo 9 apresenta os resultados de um estudo de caso sobre a telenovela Terra Nostra. A partir de uma análise de conteúdo da novela e das discussões realizadas com moradores do Distrito Federal em seis grupos focais, a pesquisa demonstra que o conteúdo político da ficção televisiva desempenha um importante “papel de orientação” para sua audiência, especialmente mulheres. Os marcos interpretativos da novela foram freqüentemente incorporados às narrativas que cidadãos comuns desenvolveram sobre temas e eventos políticos da atualidade. Finalmente, o Capítulo 10 apresenta as conclusões da pesquisa.
Ao citar trabalhos publicados originalmente em inglês, optei por apresentar minha própria tradução ao português. Portanto, as traduções contidas neste livro são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente com exatidão o seu sentido original.

SUMÁRIO

  • Apresentação
  • PARTE I: MARCO TEÓRICO
  • 1. Mídia e deliberação política: O modelo do cidadão interpretante
  • 2. Fazendo sentido do mundo da política: Narrativas, interpretação e psicologia política
  • 3. A pesquisa sobre a recepção e os efeitos da mídia:Propondo um enfoque integrado
  • 4. O modelo das controvérsias interpretativas: Um marco teórico para a pesquisa sobre comunicação política
  • PARTE II: UM ESTUDO SOBRE OS EFEITOS DOS ENQUADRAMENTOS DA TELEVISÃO NA AUDIÊNCIA
  • 5. A pesquisa: Apresentando os programas e as comunidades estudadas
  • 6. As controvérsias interpretativas no noticiário: Uma análise de conteúdo do Jornal Nacional
  • 7. “Papel e poeira no Congresso”: Resultados do primeiro experimento controlado
  • 8. O Supremo está certo?: Resultados do segundo experimento controlado
  • 9. As controvérsias interpretativas nas novelas: Um estudo de recepção sobre Terra Nostra
  • PARTE III: CONCLUSÕES
  • 10. Televisão, cidadania e democracia
  • Bibliografia
  • Peso 0,4 kg
    Dimensões 1,7 × 14,0 × 21,0 cm
    Idioma

    Ano

    2007

    Edição

    1

    ISBN

    978-85-7650-120-6

    Páginas

    326

    Versão

    ,

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